A história da propriedade da terra no Brasil
Data de 1850 a primeira iniciativa de transformação da terra
de bem comum a bem privado. Nesta data D. Pedro II promulgou a chamada “Lei de
Terras” (lei n° 601 de 18/09/1850) que determinava como proprietário somente
aquele que registrasse sua propriedade em cartório mediante um desembolso em
dinheiro para a Coroa.
Sem muito esforço conclui-se que somente fazendeiros e
outros bem-aventurados poderiam adquirir parcelas de terras para seu usufruto.
Escravos recém-alforriados e outros trabalhadores livres pobres ficaram
privados da compra.
O latifúndio começa a ser formado e dar a tônica da
estrutura fundiária no Brasil. Grandes levas de trabalhadores rurais migraram
em direção às cidades na tentativa de conseguir sua sobrevivência. O regime de
colonato se desenvolve em São Paulo, especialmente nas fazendas de café, e o
arrendamento também se torna uma forma representativa de relação de trabalho.
Em qualquer um dos dois casos o trabalhador rural exerce sua atividade nas terras
de outro.
Um segundo momento de definições sobre a questão da
propriedade da terra no Brasil ocorre na ocasião da Assembléia Constituinte de
1946, quando o debate sobre a necessidade de se fazer a reforma agrária ocupa parte
dos trabalhos constituintes. Apesar de uma Assembléia marcadamente
conservadora, foi instituído o preceito de desapropriação de terras por
interesse social, por parte do Estado.
Apesar de poucos avanços na execução do dispositivo legal,
sua inclusão no texto foi um marco importante, pois se invertia a ordem de
importância: o social antes do privado.
O início dos anos sessenta foi marcado por intensa agitação
política e social no Brasil. Ao mesmo tempo em que Jânio Quadros renunciava,
seu vice João Goulart assumia o governo e prometia implantar reformas de base.
A concentração das terras e a formação dos latifúndios
cresciam a passos largos e, na outra ponta da linha, emergiam movimentos
sociais mais organizados pela reforma agrária a partir das possibilidades que a
sindicalização no campo gerava (até o início dos anos sessenta os sindicatos rurais
eram proibidos).
A igreja católica, os sindicatos de trabalhadores, as ligas camponesas,
dentre outros, agiram no sentido de colaborar com a organização dos
trabalhadores rurais e fortalecer a sua luta pela democratização no acesso à
terra. Até mesmo o setor acadêmico e a intelectualidade, que passaram ao largo
do problema por Décadas, passaram a debater a questão.
Ainda no ano de 1962 é criado o SUPRA (Superintendência da
Reforma Agrária) que daria os primeiros passos no sentido de coibir a
existência do latifúndio. Com a derrubada de João Goulart através do golpe
militar de 1964, o quadro político se alterou de forma profunda e as
iniciativas em prol dos trabalhadores rurais foram asfixiadas.
Os anos de chumbo (período de governos militares)
representaram um retrocesso nas lutas dos trabalhadores rurais pela terra. A
prioridade passa a ser o estímulo ao desenvolvimento do capitalismo na
agricultura apoiado na grande propriedade.
Grandes autoestradas são construídas como a transamazônica e
a Cuiabá-Santarém, com três objetivos principais: a) Servir de acesso a
parcelas do território antes pouco exploradas pela agropecuária;
b) Facilitar o transporte de migrantes expulsos de suas
terras e em busca de trabalho nas frentes pioneiras e
c) Ampliar o domínio das fronteiras contra a ameaça de ocupação
estrangeira.
Os governos militares transformaram a SUPRA em INDA
(Instituto Nacional de Desenvolvimento Agrário) que depois viria a ser o atual
INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária).
Ainda no período foi criado o Estatuto da Terra, que
procurava aliviar as tensões no meio rural, mas pouco avançou em termos de
aplicação no combate ao latifúndio.
Por fim destaca-se o período da redemocratização, a partir
de 1984 quando uma forte crise econômica se abateu sobre o Brasil, forçando os
movimentos sociais das cidades e do campo a retomarem suas bandeiras de luta, até
então amordaçados pelo regime dos governos militares. O tema da reforma agrária
volta à tona não apenas no campo, mas também na academia, nos meios políticos,
nos debates sindicais, etc. e sua necessidade evidente coloca em xeque a
existência dos latifúndios e o acesso à terra para que se possa produzir mais e
melhor.
Uma das consequências diretas da ocorrência da Reforma
Agrária seria a produção ampliada de gêneros alimentícios voltados para o
mercado interno e a redução do custo de vida das camadas populares urbanas
(redução de preços pelo aumento da oferta).
De toda forma a definição da terra rural por sua finalidade social
teria um impacto muito grande no combate à fome, a subnutrição e a desnutrição,
na melhoria da qualidade de vida dos segmentos sociais mais necessitados e no
seu desempenho escolar. Não é de hoje, que se observa que em muitas escolas a frequência
dos alunos está relacionada ao oferecimento da merenda, pela absoluta falta de
alimentação em casa.